Minas Gerais

Mulheres relatam na ALMG serem vítimas de violência sexual cometida por ex-padre

Diversas mulheres relataram, nesta sexta-feira (6/12/24), serem vítimas de violência sexual cometida pelo ex-padre Bernardino Batista dos Santos, quando eram crianças e adolescentes. Em audiência pública da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), elas pediram reparação e fim da impunidade desses casos e de outras dezenas deles.

O ex-padre de 77 anos teve a prisão preventiva decretada no último dia 23 de outubro, mas acabou sendo solto no dia 28 de novembro, pouco mais de um mês após a detenção. Agora usa tornozeleira eletrônica e está sendo monitorado em casa.

A denúncia que levou à abertura de inquérito policial refere-se a um abuso cometido em 2016 contra uma menina de quatro anos à época, em Tiros (Alto Paranaíba). Mas há muitas outras denúncias de violência sexual contra o ex-pároco nessa cidade e em Belo Horizonte, conforme destaca a advogada Ana Carolina Campos.

Como contou, ela representa mais de 60 mulheres vítimas de Bernardino Batista dos Santos. De acordo com a advogada, os abusos começaram a partir de 1975 e o último que se tem notícia é o ocorrido em 2016.

“São décadas de casos e denúncias de violência contra mulheres. Muitos foram levados ao conhecimento da Arquidiocese de Belo Horizonte que nada fez.”
Ana Carolina Campos
Advogada
Representantes da arquidiocese foram convidados, mas não compareceram à reunião.

Próximo das famílias
Muito além de uma estatística, essas mulheres são hoje adultas e têm histórias diferentes. Mas, em comum, elas relataram de forma emocionada terem ado por uma violência traumática, praticada por uma pessoa que era da confiança da família, que repercute até hoje em suas vidas.

Segundo os relatos, os abusos aconteceram na Paróquia Nossa Senhora Medianeira e Santa Luzia, no Bairro Paraíso, na Região Leste de Belo Horizonte, onde Bernardino Batista dos Santos foi pároco por cerca de 30 anos, e também em Tiros, onde ele tinha um sítio e levava as crianças para excursões.

A advogada Marcia Gonçalves contou que ou pela violência no fim dos anos 70 e início dos anos 80.

“O que esse padre fez foi uma crueldade. Ele conquistava a família das crianças e se infiltrava nos lares. Participava dos almoços de domingo nas casas. Era uma presença constante.”
Marcia Gonçalves
Advogada
Engenheira ambiental, Fernanda Azevedo relatou que ou pela situação em 2000, quando tinha nove anos. Conforme contou, o então padre tinha celebrado o casamento dos seus pais e o seu Batismo e Primeira Comunhão. “Eu só pensava o porquê dele ter feito isso comigo. Ele me batizou.”

Violência contínua
Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher – debate sobre abusos sexuais cometidos por ex-padre
Audiência pública foi realizada pela Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher para ouvir os relatos

Também advogada, Carolina Rocha de Freitas relatou ter sofrido o abuso quando tinha oito anos. Ela contou que sempre frequentou a paróquia, onde também fez a Primeira Comunhão. Conforme disse, ela e as demais mulheres continuam sendo vítimas até hoje na medida em que a Arquidiocese de Belo Horizonte não dá respostas a quem sofreu a violência.

Carolina Rocha disse que quer ter o a um documento de 2021, do Vaticano, sobre a expulsão do padre, o qual a arquidiocese alega existir.

“Sigo minha vida, mas muitas não conseguem prosseguir. Mesmo assim tenho depressão e síndrome do pânico”, relatou.

Vítimas da violência sexual esperam que a divulgação do caso encoraje mulheres a denunciarem outros episódios e cobram que também haja punição por parte da Igreja Católica

Crime parece ser menor
Segundo a professora de história Aline Moreira, ela ou pela violência em 1987, quando tinha nove anos e era coroinha da igreja.

“A sensação que eu tenho é que hoje, por sermos mulheres, o crime parece ser menor. Por que falar sobre isso agora? Por que tanto tempo depois? Mas e se fosse a sua filha? Eu fui uma criança. Eu não sabia o que era sexualidade.”

Aline Moreira deu detalhes do que viveu. Como contou, depois de uma missa num sábado, o ex-padre pediu para que ela o ajudasse numa outra missa e ficou de ligar para os seus pais para ter autorização. Conforme relatou, ela o acompanhou até uma sala de reuniões para que ele fizesse esse telefonema.

“Na sala de reuniões, ele me colocou em cima da mesa e subiu em cima de mim. Eu não sabia o que estava acontecendo. Era uma mistura de medo. Eu sabia que algo estava errado, mas ainda tinha respeito por ele que, na minha visão, era um santo”, contou, acrescentando que, depois de ter saído desse espaço, nunca mais voltou à igreja.

Essa forma de atuação também foi relatada por outras mulheres como a empresária Cibele Itaboray Frade, que relatou ter sofrido a violência no início da década 80, quando tinha sete anos.

Consequências para a vida toda

Mulheres cobram justiça contra abusos de ex-padre

Já Ana Paula Costa contou que tinha 11 anos quando foi violentada, o que ocorreu em 1987. “Quando ele me machucava, eu só pensava o que eu tinha feito de tão ruim para merecer aquilo”, contou.

Ela relatou que não falou com ninguém sobre o ocorrido e só foi entender o que tinha se ado quando tinha por volta de 18 anos.

Mesmo tendo feito anos de terapia, ela disse que a violência afetou os seus relacionamentos, porque tem dificuldade de confiar nas pessoas, e contribuiu para que não quisesse ter filhos.

“Esse monstro atrapalhou minha relação com Deus. Que Deus é esse que permite que um padre faça o que ele fez comigo e com todo mundo que está aqui?”
Ana Paula Costa
Vítima
A advogada Carine Silva também relatou ter perdido a fé depois de ser violentada na sacristia da igreja no fim dos anos 80. Hoje, com 46 anos, ela relata ser pesado relembrar a história que viveu durante cerca de um ano naquela época.

Importância de denunciar
De acordo com a advogada das vítimas Ana Carolina Campos, na esfera judicial, muitos dos crimes já prescreveram, uma vez que as denúncias começaram no início dos anos 2000 e a mudança no Código Penal sobre os crimes sexuais contra crianças e adolescentes ocorreu só em 2012.

Atualmente, a contagem para a prescrição é calculada a partir de quando as vítimas completam 18 anos, e não mais da data do abuso.

Apesar disso, Ana Carolina Campos enfatizou que vem realizando trabalho no direito civil, no âmbito indenizatório.

“Fica aqui o meu apelo para quem foi vítima ou conhece alguém que foi vítima do padre Bernardino Batista dos Santos para que entre em contato. É muito importante que você se junte ao grupo e tenha certeza de que nós estamos aqui para protegê-la”, afirmou.

Deputadas apoiam vítimas
A deputada Bella Gonçalves (Psol), que solicitou a audiência, enfatizou que os casos de violência sexual aconteceram no interior de uma instituição religiosa de muito renome e prestígio, sobre a qual as famílias confiaram muito.

“Mulheres vitimadas, muitas delas há décadas atrás, falaram hoje pela primeira vez em um espaço institucional sobre a violência que viveram. Elas estão organizadas na busca por justiça e nós vamos levantar quais são as medidas para a gente obter essa justiça.”

Já a deputada Ana Paula Siqueira (Rede), que preside a comissão, ponderou que, embora os casos tenham se iniciado há décadas atrás, ainda têm muito impacto na vida das vítimas.

“O espaço religioso deveria ser seguro, assim como nossos lares. É necessário que a justiça seja feita”, defendeu.

Para delegada, caso é bárbaro e merece mais rigor
A chefe da Divisão Especializada em Atendimento à Mulher, ao Idoso e à Pessoa com Deficiência e Vítimas de Intolerância, Danúbia Soares, explicou que o fato de a prisão do ex-padre ter sido convertida em outras medidas (uso da tornozeleira, por exemplo) é injusto, embora seja legal.

“A prisão deveria ser a regra nesse tipo de caso. O mínimo que essas mulheres merecem é que ele encerre a vida na cadeia.”
Danúbia Soares
Delegada
A delegada Danúbia Soares defendeu ainda que sejam implementadas mudanças no âmbito do poder legislativo federal para que seja alterado o tempo para a prescrição de crimes. Ela explicou que, estando prescrito, não é possível mais investigar.

Outra mudança necessária, na opinião dela, é que sejam aplicadas medidas alternativas à prisão apenas em casos menos complexos.

Fonte: ALMG

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